Um (triste) banco de madeira

         

                 Ela saiu caminhando pelas calçadas banhadas em chuva enquanto observava o brilho da lua refletir na poça d´água ao seu lado. Reprimiu o forte desejo de pular na poça, continuando a caminhar lentamente. Ao passar por uma casa de sacada, ouviu o conhecido som da abertura do jornal típico daquela hora. Lembrou de seus pais e de como não sentia mais aquela extrema necessidade de estar em casa que costumava sentir quando era uma criança. Desviou os olhos daquela casa onde provavelmente morava uma família feliz com seus típicos problemas. Uma mãe cozinheira que assistia o jornal impreterivelmente todas as noites, um pai ausente que chega tarde em casa vestindo um terno e gravada e uma criança que corre pela casa soltando gritos estridentes. Ela sorriu ao ouvi-los, lembrando-se de sua infância. Continuou caminhando e tentando manter seus passos sincronizados com o padrão da calçada. Quando resolveu finalmente parar, encostou-se em um poste de luz e pôs-se a observar a grande praça iluminada lotada de rostos estranhos cheios de alegrias e tristezas. Um garoto passava na ponta da calçada do outro lado da rua conduzindo um skate, ele manobrava e parecia fazer mágicas que ela não conseguia entender, e era exatamente isso que continuava fazendo com que ela não desviasse o olhar dele. Ela o chamou mentalmente de skatista descolado. A figura do garoto alto de touca e botas pretas foi diminuindo e desaparecendo de sua vista. Ela sorriu e focou em uma garota sentada em um triste banco de madeira com um violão entre suas pernas. Ela desejou que pudesse ouvir cada nota que era tocada pela garota, que dedilhava com delicadeza. Ela fechou os olhos e imaginou a melodia mais perfeita que pudesse ser ouvida no planeta. Quando abriu seus olhos, a menina havia ido embora e restava-lhe apenas um triste banco de madeira vazio para ser observado. Ela criou coragem e atravessou a rua. Caminhou até o triste banco de madeira e sentou tentando imaginar a quantidade de pessoas que já sentaram naquele banco. Talvez ela devesse deixar de denominá-lo triste. Uma menina com um violão, uma criança com um carrinho de brinquedo, uma mãe com um bebê de colo faminto por leite, um casal apaixonado procurando um pouco de paz e ela, que sentou no banco inicialmente sem razões e esperanças, mas que logo passou a ter um animalzinho de asas que antes era apenas uma lagarta movendo em seu estômago. Ela sorriu para o estranho que acabara de sentar ao seu lado. O skatista descolado sorriu de volta.

Comentários

Postar um comentário

❤ Proibido usar palavras de baixo calão
❤ Não há moderação de comentários
❤ Deixe o link do seu blog para que eu também possa visitá-lo e segui-lo no Google Friends Connect!